Pedro Luiz, de 18 anos, acorda todos os dias cedo, percorre 15,4 quilômetros levando a bicicleta no ônibus ou pedalando do Jardim Miriam, zona sul, até a Bela Vista, na região central de São Paulo, para trabalhar como entregador de aplicativo.
“Não tem horário certo para começar e terminar o trabalho. Chego de manhã, perto das 10h, e vou embora só à noite, em torno das 21h”, afirma.
Pedro atende os chamados da Rappi e do iFood. Com o dinheiro que ele ganha com a função, ajuda a sustentar a casa onde mora com a mãe e mais dois irmãos e o financiamento da bicicleta que comprou para o serviço.
“No momento não tá tendo oportunidade de trabalho, então é melhor do que ficar desempregado.”
Sem carteira assinada há alguns anos, Pedro pretende estudar para conseguir mudar de profissão, mas diz que ainda não tem nada em mente.
A rotina de Pedro não é um caso isolado, durante a grave crise social desencadeada pela pandemia do novo coronavírus, a taxa de desemprego atingiu quase 14 milhões de brasileiros, segundo dados do IBGE.
Nesse meio tempo, o serviço de entregas por aplicativo deixou de ser uma demanda diferencial para se tornar essencial.
Como tantas outras, essa categoria de trabalhadores enfrenta o risco da exposição ao vírus da covid-19, diariamente, em uma cidade onde as extensões de ciclofaixas são insuficientes.
Com pouca remuneração, muitas vezes não conseguem equipamentos de proteção e, para ganhar o equivalente, realizam uma carga horária acima do que é considerado saudável para fazer valer o serviço.
A advogada Raquel Santana, mestre em Direito, Estado e Constituição, analisa que a chamada “Uberização do Trabalho” tende a tornar as relações empregatícias cada vez mais informais e precárias.
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“Com a Uberização, todos os riscos e custos da realização do trabalho são transferidos para os trabalhadores, que não são reconhecidos como ‘empregados’. Logo, eles não têm acesso a direitos trabalhistas básicos, ainda que estejam subordinados às empresas”, analisa Raquel.
A especialista menciona, por exemplo, que as decisões judiciais sobre a questão em outros países, como França, Itália e, mais recentemente, o Reino Unido, demonstram a possibilidade de manutenção do funcionamento ordinário dessas empresas. “O que pressupõe, entre outros, a aferição de lucros, com a contratação de trabalhadores que acessem direitos sociais trabalhistas básicos”, diz.
No ano passado, entregadores de aplicativos protestaram em diversos Estados do país, reivindicando seus direitos. O movimento ganhou proporção com o agravamento da pandemia de covid-19, pois a taxa de desemprego fez aumentar o número de motoboys e ciclistas na função. Com a alta da demanda pelo serviço, porém, houve desvalorização do trabalhador.
O primeiro “Breque dos Apps” ocorreu no dia 1º de julho de 2020, quando os entregadores se organizaram via WhatsApp.
A paralisação, que causou transtornos ao redor do país, tinha como principal objetivo reivindicar:
– aumento nas taxas de entrega;
– aumento da taxa mínima;
– fim dos bloqueios indevidos;
– seguro para roubos e acidentes;
– licenças pagas para entregadores infectados na pandemia;
– distribuição de EPIs (equipamentos de proteção individual).
Segundo Rafael Felix, organizador do movimento, nos dias 18,19 e 20 de abril deste ano, foi solicitada autorização na Justiça para uma nova paralisação. Desta vez, o movimento daqui quer se unir ao de outros países, como, Chile, Argentina, Colômbia e Portugal. A expectativa é que a mobilização seja maior do que as anteriores.


