Mensagens encontradas pela Polícia Federal (PF) no celular de Maurício Camisotti, que está preso por suposto envolvimento no esquema bilionário de descontos indevidos contra aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mostram a tentativa do empresário de “influenciar o andamento de trabalhos investigativos” na Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) do Congresso.

As mensagens, que foram trocadas por Camisotti (foto em destaque) com o advogado Nelson Wilians e um interlocutor ainda desconhecido salvo com o codinome “GS-USA” nos contatos do celular, citam três parlamentares que poderiam ser abordados por aliados do empresário para blindá-lo na CPMI do INSS, criada para investigar o escândalo revelado pelo Metrópoles.
Nas conversas, Camissotti insiste em falar com o senador Izalci Lucas (PL-DF), autor de requerimentos de convocação do empresário, da mulher dele e de outros três integrantes de seu grupo empresarial, enquanto que o interlocutor sugere diálogos com o líder da oposição na Câmara dos Deputados, Luciano Zucco (PL), e o deputado Paulo Pimenta (PT), ambos do Rio Grande do Sul.
Os diálogos encontrados pela PF (veja abaixo) ocorreram entre 22 de agosto, dois dias após a instalação da CPMI, e 11 de setembro, um dia antes de Camisotti ser preso junto com o lobista Antonio Carlos Camilo Antunes, o Careca do INSS. O empresário é apontado como beneficiário final do dinheiro arrecadado por três entidades envolvidas nas fraudes dos descontos contra aposentados. Ele nega.
Ao Metrópoles Izalci repudia qualquer tentativa de “associar seu nome a pessoas ou fatos investigados pela CPMI do INSS”. Já Zucco ressaltou que não é membro da CPMI e chamou os participantes das conversas de “lobistas” e “vagabundos”. Paulo Pimenta destacou que nunca conversou com o empresário ou “qualquer pessoa por ele indicada” e que convocou Camisotti e a esposa para depor.
A defesa de Maurício Camisotti afirma que “as trocas de mensagens destacadas pela PF se tratam de conversas absolutamente lícitas” e que “não há qualquer relação com a uma tentativa de obstrução de Justiça” (leia as notas abaixo).
As mensagens do empresário da Farra do INSS
Segundo a PF, os dados do celular de Maurício Camisotti demonstram que o empresário fazia, de forma sistemática, “atos para blindagem da sua imagem no seio público ou no meio político, sendo este último com objetivo de barrar ou influenciar eventual requerimento da Comissão Mista Parlamentar de Inquérito (CPMI) em andamento no Congresso Nacional”.
“Tais registros, por si sós, não evidenciam conduta delituosa. Contudo, revelam a capacidade de o investigado aproximar-se de estruturas de poder a ponto de potencialmente influenciar o andamento de trabalhos investigativos conduzidos seja no âmbito policial ou na Comissão Parlamentar de Inquérito”, acrescentou a PF, ao pedir a manutenção da prisão de Camisotti.
Nas conversas, Camisotti demonstra preocupação com a sua convocação, da sua esposa e de pessoas ligadas às suas empresas. O empresário cita nominalmente cinco investigados, dos quais apenas dois não foram convocadas. Executivos de empresas de Camisotti, Rodrigo Rosolem Califoni, do Grupo Total Health, e Luís Blotta, do Grupo Rede Mais, foram poupados da CPMI até o momento.
Na semana anterior ao início da CPMI, o advogado Nelson Wilians, que fez transações milionárias com o empresário e negou qualquer envolvimento com as fraudes em depoimento à comissão, fez uma chamada pelo WhatsApp com Camisotti e enviou ao empresário uma lista com deputados e senadores que iriam participar do colegiado.
Depois, Wilians encaminhou uma notícia com os parlamentares que apresentariam, já no início dos trabalhos, o maior número de requerimentos de convocação e quebra de sigilo de suspeitos. Eles voltaram a falar sobre o assunto em 11/9, uma semana antes de Wilians comparecer à comissão.
Camisotti sugeriu ao advogado falar com o senador Izalci Lucas, e Wilians respondeu que preferia falar sobre o assunto depois. Procurado pela reportagem, o parlamentar repudiou a mensagem e lembrou que um dos seus 400 requerimentos resultou na convocação de Wilians.
Na representação encaminhada neste mês ao ministro André Mendonça, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), a PF afirma que, “na interlocução com Nelson Wilians, a maior parte das mensagens foi excluída em razão do recurso de ‘mensagens temporárias’ do aplicativo WhatsApp, configurado por ele para apagar automaticamente os conteúdos trocados após 24 horas”.
A três dias do início efetivo da CPMI, em 23/8, Camisotti trocou mensagem com o contato salvo com o codinome “GS-USA”, cujo número tem código do Texas, nos Estados Unidos. Embora o homem tenha o telefone texano, há indícios de que ele circule entre o Sul do Brasil, São Paulo e Brasília.
Em um trecho, a pessoa ainda não identificada diz que acabou de sair de uma “reunião agora daquele tema do deputado aqui do Sul”. Eles falavam sobre o líder da oposição, deputado Zucco (PL-RS). Ao Metrópoles o parlamentar negou que tenha se reunido com a pessoa em questão e sugeriu que se trate de um lobista que usou seu nome para mostrar influência.
O nome do líder da oposição é citado novamente em uma outra mensagem, na qual o homem não identificado fala de uma reunião em uma churrascaria, na zona oeste da capital paulista. O interlocutor de Camisotti também diz que Zucco é membro da CPMI, o que não é verdade.
“Nesse diálogo, o interlocutor menciona o nome do Deputado Zucco como pauta de uma reunião ocorrida às 13h00 na Churrascaria Rodeio, localizada no Shopping Iguatemi, em São Paulo/SP. Segundo o conteúdo da mensagem, o interlocutor teria participado do encontro juntamente com outras seis pessoas, sendo o investigado representado por Rodrigo Califoni”, diz a PF sobre a mensagem.
As movimentações de Camisotti não conseguiram barrar a sua convocação, aprovada logo no primeiro dia da CPMI. A quebra de sigilo de Camisotti foi aprovada duas semanas depois, em 11/9. No dia seguinte, ele foi preso preventivamente em um desdobramento da Operação Sem Desconto. O empresário segue detido na sede da PF em São Paulo.


